segunda-feira, 5 de março de 2007

O horizonte das palavras


Liliana Porter

Sem direcção, sem caminho
escrevo esta página que não tem alma dentro.
Se conseguir chegar à substância de um muro
acenderei a lâmpada de pedra na montanha.
E sem apoio penetro nos interstícios fugidios
ou enuncio as simples reiterações da terra,
as palavras que se tornam calhaus na boca ou nos meus passos.
Tentarei construir a consistência num adágio
de sílabas silvestres, de ribeiros vibrantes.
E na substância entra a mão, o balbucio branco
de uma língua espessa, a madeira, as abelhas,
um organismo verde aberto sobre o mar,
as teclas do verão, as indústrias da água.
Eu sou agora o que a linguagem mostra
nas suas verdes estratégias, nas suas pontes
de música visual: o equilíbrio preenche os buracos
com arcos, colinas e com árvores.
Um alvor nasceu nas palavras e nos montes.
O impronunciável é o horizonte do que é dito.
António Ramos Rosa
ACORDES, QUETZAL EDITORES, 1990, 2ª EDIÇÃO, P. 81

4 comentários:

Art&Tal disse...

gostei

do pouco que é muito

[A] disse...

Valha-me Nossa Senhora! Deu-te para a poesia!!!

Cruz credo, eu e a minha parvalheira!

intruso disse...

o poema é uma "aparição"

bom reencontrá-lo...

linhas tortas disse...

"fantasmas" Intruso, "fantasmas" ?!

O que queres @, vício de postar mesmo com falta de inspiração!

:)

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